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Por que e quando devo alterar a convenção de condomínio – e como esse processo pode ser mais simples do que parece?

By 29/04/2025No Comments9 min read

As convenções de condomínio precisam ser atualizadas para lidar com desafios modernos como carregamento de carros elétricos e locação por plataformas.

Por Gustavo Mendes de Oliveira e Natalia Dupin

Muitas convenções de condomínio, embora originalmente bem estruturadas, não acompanharam a evolução do tempo frente a temas modernos. Elaboradas em contextos sociais, tecnológicos e juridicamente distintos, tais convenções deixam de regulamentar os desafios contemporâneos da vida em condomínio. 

Questões como a instalação de pontos para carregamento de veículos elétricos, limites à liberdade de reforma nas unidades, o regramento sobre a locação pelas plataformas de locação por curtos períodos, como a Airbnb, o tratamento das questões referentes à inadimplência reiterada ou à presença de animais nas unidades autônomas exigem previsão expressa e atualizada.

A ideia popularizada de que alterar a convenção de um condomínio é um “bicho de sete cabeças”, caro e extremamente burocrático, precisa ser superada.

Na prática, atualizar a convenção é juridicamente possível, como também estrategicamente recomendável para garantir uma gestão condominial moderna, efetiva e alinhada com a realidade atual dos condôminos.

E, em alguns casos, quando as mudanças são muitas e profundas, vale até pensar na elaboração de uma nova convenção, bem construída, com base na realidade atual do condomínio e nas necessidades coletivas.

1) O que é a convenção de condomínio e qual é o seu objetivo?
A convenção de condomínio é um instrumento de Direito Privado que regulamenta as normas de conduta e gestão de um condomínio, estabelecendo, dentre outros pontos: os direitos e deveres dos condôminos, nos termos arts. 1.335 e 1336 do CC, a título exemplificativo; os critérios de administração e gestão condominial; as regras para uso das áreas e serviços comuns; a realização de assembleias e quóruns para as deliberações; a eleição de síndico e do conselho fiscal; a aplicação de multas; a destinação do edifício (residencial, comercial ou misto); as restrições ao uso da propriedade; os encargos e a proporção das quotas condominiais.

Pela legislação brasileira, para que um condomínio seja reconhecido como um “condomínio edilício” e, portanto, imponha obrigações e direitos a todos os seus condôminos, é indispensável a elaboração de uma convenção condominial, tanto por escritura pública quanto por instrumento particular, subscrita pelos titulares de, no mínimo, 2/3 das frações ideais, tornando-se, desde logo, obrigatória para todos os titulares de direito sobre todas as unidades autônomas, nos termos do art. 1.333 do CC. Além disso, a convenção precisa ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis do edifício, o que garante sua oponibilidade perante terceiros, como futuros adquirentes, locatários, visitantes ou quaisquer interessados que não sejam condôminos à época da aprovação.

Sem a convenção condominial constituída e registrada, os condôminos podem enfrentar incertezas jurídicas e disputas frequentes em relação a vários aspectos, tais como: (i) dificuldades na convivência, diante da ausência de regras claras sobre horários de silêncio, uso das áreas e serviços comuns e restrições quanto a presença animais de estimação; (ii) falta de clareza e uniformidade na hora de fazer valer os deveres e direitos dos condôminos, como a obrigação de contribuir com as despesas condominiais, o direito de participar das assembleias e o direito de usufruir das áreas e serviços compartilhados; (iii) conflitos e dificuldades na gestão do condomínio, pela indefinição quanto à convocação e funcionamento das assembleias, eleição de síndico e conselho fiscal, bem como as regras para prestação de contas e tomada de decisões; (iv) divergências sobre o uso das áreas comuns, especialmente  em questões que impactam o uso da piscina, academia, salão de festas, ou ainda as normas aplicáveis a reformas e alterações nas unidades privativas. 

Já o regimento interno, por sua vez, é o documento que complementa a convenção e regula questões essenciais para o dia a dia da vida em condomínio, como os horários de funcionamento das áreas comuns, regras para uso do salão de festas, normas para o uso de vagas de garagem, presença de visitantes, entre outros pontos que garantem a organização da rotina condominial. 

2) Quais são os quóruns para alterar a convenção e o regimento e para a elaboração de nova convenção de condomínio?
De acordo com o CC:

  • Para a elaboração de uma nova convenção (constituição de um condomínio ou substituição integral da convenção anterior por uma nova), o quórum exigido é de 2/3 das frações ideais; 
  • Para a alteração da convenção condominial é exigido o voto favorável de 2/3 (dois terços) do total dos condôminos, levando em consideração as frações ideais, caso se aplique; ou seja, maioria qualificada absoluta, nos termos do art. 1.351, primeira parte, do CC; 
  • Já a alteração do regimento interno está sujeita ao quórum livremente estipulado na convenção, conforme entendimento jurisprudencial.

3) E se o quórum especial não for atingido? Existe alternativa?
Sim. A lei 14.309/22 inovou ao permitir que a assembleia seja convertida em sessão permanente, por decisão da maioria dos presentes, conforme dispõe o art. 1.353, §§ 1º a 3º, do CC. Na prática, significa que: (i) a assembleia pode se estender por até 90 dias, permitindo coleta escalonada de votos; (ii) os votos registrados durante a primeira convocação permanecem válidos, sem que haja necessidade de comparecimento dos condôminos para sua confirmação; (iii) as unidades ausentes na primeira sessão serão convocadas para votar posteriormente; e (iv) a deliberação final ocorrerá em uma nova data previamente agendada, ao término da sessão permanente.

Essa alternativa tem se mostrado particularmente eficaz em condomínios com grande número de unidades, nos quais atingir quóruns qualificados, como o de 2/3, representa um desafio recorrente do ponto de vista prático e operacional.

4) Posso realizar a assembleia de forma virtual?
Sim. O art. 1.354-A do CC, também introduzido pela lei 14.309/22, evoluiu ao autorizar expressamente as assembleias por meio eletrônico, desde que (i) não haja proibição na convenção; e (ii) todos os condôminos tenham acesso ao direito de voz, debate e voto.

Além disso, o provimento 183/24 do CNJ, que entrou recentemente em vigor, trouxe importante inovação ao permitir o reconhecimento de firma apenas do síndico, em documentos como as atas que aprovam alterações convencionais ou deliberam sobre matérias relevantes do condomínio, nos termos do art. 353-A do Código de Normas, inclusive na modalidade de reconhecimento de assinatura eletrônica. Tal medida representa um avanço tecnológico e reduz a burocracia, especialmente aos atos oriundos de deliberação em assembleias.

Todavia, por se tratar de norma recente e cuja aplicação prática ainda pode suscitar interpretações distintas, é altamente recomendável a realização de uma consulta prévia ao registro de imóveis competente, evitando, assim, a emissão de notas devolutivas que possam atrasar ou inviabilizar o registro de atos aprovados nas assembleias.

5) Alterar a convenção é caro?
Não. O investimento necessário dependerá da quantidade de unidades autônomas e do grau de complexidade das alterações propostas. Com o devido planejamento, é perfeitamente possível viabilizar financeiramente a alteração tanto da convenção quanto do regimento interno, seja (i) através do parcelamento dos valores entre os condôminos; (ii) adotando a alteração por instrumento particular; e até (iii) através da elaboração de uma redação jurídica alinhada às mais recentes alterações legislativas e procedimentais.

6) Conclusão
É juridicamente possível e financeiramente viável elaborar nova convenção de condomínio, ou, conforme o caso, atualizar a convenção condominial e o regimento interno existentes, de forma compatível com as demandas atuais da vida em condomínio. 

Trata-se, pois, de uma decisão estratégica que impacta diretamente a vida dos condôminos, permitindo – com planejamento financeiro e suporte jurídico especializado – alcançar maior segurança jurídica nos atos de gestão do condomínio, mais harmonia entre os condôminos, valorização patrimonial do edifício, além de proporcionar uma gestão mais moderna, eficiente e alinha à realidade atual.

Fonte: Migalhas